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quinta-feira, 14 de maio de 2009

É BOM SER GAÚCHO. VC É D+ LETÍCIA, PARABÉNS

4 de maio de 2009 | N° 15969AlertaVoltar para a edição de hoje

LETICIA WIERZCHOWSKI

  • Da nossa timidez secular

    Somos um povo cheio de qualidades. Corajosos desde os tempos do Império, somos seres responsáveis e pra lá de organizados. Gaúcho é sinônimo de trabalhador, e lá nas grandes cidades do sudeste, quando chega um gaúcho numa empresa, pressupõe-se que chega um cara cumpridor. Mas somos tímidos… Ah, como somos tímidos! Dê uma olhadinha num gaúcho e você verá um sujeito afável e retraído. Entre numa fila de cinema no Rio de Janeiro, e entre numa fila de cinema em Porto Alegre, e você verá a diferença. Carioca, um bicho acostumado com pouquíssima roupa e aquele encontro diário na areia, anda sempre encontrando um amigo aonde quer que vá. Carioca não tem conhecido, tem amigo mesmo, assim direto. E fila de cinema no Rio é uma coisa viva, em movimento e mutação constantes. Já a nossa fila é como consta no dicionário: uma série de pessoas dispostas em linha reta, ao lado ou atrás uns dos outros.

    Acontece que o gaúcho é cabreiro. Você vê um conhecido por aí e existe uma chance de 50% de o cara não te dar um oi. Na horinha H, quando vocês se cruzarem, ele vai mexer na pasta, vai pegar o celular, vai desviar dos seus olhos por algum motivo. Fique calmo, você não é chato não. É que gaúcho é um povo mais sutil. Comigo acontece toda hora: eu vejo um conhecido, ensaio um olá, mas nossos olhares não se cruzam. E lá se vai o fulano ou a sicrana sem que a gente tenha se cumprimentado como manda o figurino. Fiz uma enquete com amigos e descobri que o mais comum é isso mesmo, pouco oi por aí. Gaúcho não gosta de jogar conversa fora – até o mate a gente tem que tomar logo, antes que esfrie. Nós, que não crescemos na beira da praia, somos uma gente mais tímida... Talvez por isso, gaúcho goste tanto do Rio de Janeiro.

    Mas, enfim, como escreveu Tabajara Ruas no seu belo romance Netto Perde sua Alma, enquanto o Rio de Janeiro era Atenas, aqui nós éramos Esparta. Não havia Corte, nem bailes, nem comitivas reais. Havia muita peleja nessas fronteiras dançarinas, isso sim. Sem bailes e sem palácios, por séculos vivemos quietos criando gado nas nossas estâncias, ou construindo cidadezinhas réplicas de uma saudosa Europa perdida para além-mar. Não deu tempo de exercitar nosso savoir-faire. Mas sou eu quem está criando caso. Afinal de contas, fila de cinema é para entrar no cinema, não é para fazer social.

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